Em finais de 1935, inicia-se no "Le Petit Vingtiéme", mais uma aventura de Tintin. Desta vez parte para a América do Sul, onde vai viver movimentadas peripécias num pais imaginário – San Theodoros – onde conhecerá 2 generais, Alcazar e Tapioca que alternam no poder. (...)
Tintin parte à procura de uma estatueta Arumbaya, roubada (logo no início da historia) de um museu. Mais tarde, na década de 60, Philippe de Broca, baseia-se nesta aventura para criar o mais “tintineano” filme de aventuras realizado, - "O Homem do Rio", com Jean Paul Belmondo - mesmo incluindo aqueles com a figura de Tintin e desempenhados por J. P. Talbot. A ver (ou rever) com urgência!
Em Portugal aparece no número 247, de 04/01/1940 de "O Papagaio" com o título de "O Mistério da Orelha Quebrada". A aventura cobre todo o ano de 1940, finalizando no número 298 de 26/12/40.
Mais tarde o semanário Tintin reinicia a sua publicação a partir de 13/10/1973 com o título "A Orelha Quebrada".
As editoras brasileiras Flamboyant e Record tinham já editado o álbum na segunda metade dos anos 60 desta vez com o título "O Ídolo Roubado". Mais recentemente a Verbo publicou-o como "A Orelha Quebrada".
Alberto Gonçalves, 27/03/2004
O HOMEM DO RIO
ESTREIA : 15/10/1964 CINEMA SÃO JORGE
Uma estatueta brasileira da civilização malteca é roubada ao Musée de l'Homme, em Paris. Fazia parte de um grupo de três estátuas, trazidas por três exploradores: o Professor Catalan (Jean Servais), que trabalha no Musée de l'Homme, o tragicamente falecido Professor Villermosa e André de Castro, um rico empresário brasileiro. O professor Catalan é raptado em frente ao museu. O soldado Adrien Dufourquet testemunha o rapto da sua noiva Agnès Villermosa, filha de um famoso etnólogo. Vai em busca dela, o que o leva ao Brasil...
A imaginação de Philippe de Broca foi expressa nos seus primeiros filmes num estilo ainda imbuído da Nouvelle Vague. Sem fazer realmente parte do movimento, a sua forma de dinamizar o romance e o marivaudage clássico ("Les Jeux de l'Amour" e "Le Farceur" (1960)) fazia parte do mesmo desejo modernista. Com "Cartouche" (1962), um grande filme de aventuras históricas, era possível adivinhar a reviravolta mais popular que libertaria as obras seguintes. "O Homem do Rio" estabelece, assim, uma ponte ideal entre o De Broca inicial e o De Broca mais abertamente mainstream do resto da sua carreira, onde a energia artística da Nova Vaga colide com um horizonte mais vasto, com fuga e grande aventura.
O filme nasceu inicialmente de um projeto de adaptação de Tintim, no qual De Broca esteve envolvido (após a saída de Alain Resnais, inicialmente prevista), mas o realizador rapidamente se apercebeu dos limites de uma transposição literal das vinhetas de Hergé e deitou a toalha ao chão. Em vez de uma adaptação verdadeira, considerará uma história original onde poderá misturar o seu próprio tom com a energia e o estilo das aventuras de Tintim. Uma estadia no Rio com Jean-Paul Belmondo para a promoção de "Cartouche" impôs-lhe imediatamente na mente esta estrutura para o futuro filme e, após uma longa sessão de argumento com o seu colaborador regular Daniel Boulanger e o seu amigo Jean-Paul Rappeneau, que ainda não tinha assumido a realização, "L'Homme de Rio" viu gradualmente a luz do dia.
A influência de Tintim é evidente, quer em termos visuais, narrativos ou narrativos. O roubo inicial da estatueta, a silhueta do ladrão e o cenário do Musée de l'Homme levam-nos imediatamente de volta a "A Orelha Quebrada". Os raptos e, mais tarde, a busca pelas estatuetas e pela maldição que as envolve, remetem, obviamente, para o díptico "As Sete Bolas de Cristal"/"O Templo do Sol".
O empréstimo mais belo, porém, será esta energia frenética e a velocidade da história e, da mesma forma que Hergé conseguia levar-nos de uma Europa acinzentada às terras mais exóticas em duas páginas e muitas aventuras, De Broca deixa Paris para o sol do Brasil em vinte minutos de introdução ideal.
Numa linha narrativa perfeita e clara, todas as informações e caracterizações das personagens são feitas num movimento perpétuo e jubiloso. Vai do mais explícito (o passado dos estudiosos, as três estátuas) ao mais subtil (o olhar furtivo e ligeiramente lascivo de Jean Servais sobre Françoise Dorléac, que nos permite suspeitar vagamente do que lhe acontecerá a seguir) e podemos sentir o toque de Jean-Paul Rappeneau, já tão hábil em casar anarquia e construção rigorosa. O casal Jean-Paul Belmondo / Françoise Dorléac traz o toque romântico adulto e atrevido que torna tudo tão brilhante.
Em vez do piegas Tintim, Belmondo estaria mais próximo de um Capitão Haddock juvenil, com este herói francês e rabugento dedicado a dois objectivos: salvar a sua noiva e regressar a tempo da sua licença em Paris.
É neste filme que nasce "Bébel", o herói ousado e debochado, mas mais do que o mecânico indestrutível dos anos seguintes, a sua silhueta frágil e elástica traz realmente este lado irresistível de banda desenhada/cartoon, fazendo-o levantar-se de cada queda, ripostar contra adversários muito mais imponentes. Françoise Dorléac está adorável como uma donzela caprichosa em perigo e as trocas tempestuosas entre o casal a meio da ação são uma delícia do início ao fim.
De Broca leva-nos numa viagem pelo cativante Brasil dos anos 60, explorando com igual brilhantismo a urbanidade moderna (com a sua quota-parte de edifícios de alta tecnologia) e os ambientes operários mais fervilhantes e festivos, mas também a natureza exótica e colorida (o lado da banda desenhada também não é esquecido, como o falso crocodilo à espera de Belmondo durante a sua aterragem de paraquedas). De Broca multiplica as aventuras e os ambientes com rara inventividade, sem nunca se cansar graças a pausas cómicas ou piadas em abundância (o carro cor-de-rosa com estrelas verdes!).
Este movimento perpétuo retoma também o princípio da linha clara que orienta o guião. Veremos que na sua perseguição frenética, Jean-Paul Belmondo terá sempre de seguir em frente para alcançar os malvados raptores de Françoise Dorléac.
Outra grande influência de "L'Homme de Rio" é a banda desenhada de inspiração belga, com Hergé e o seu Tintin à cabeça. Relembre-se nomeadamente "L'Oreille Cassée / O Ídolo Roubado", livro no qual o filme vai colher muita da sua inspiração, mas grande parte das sequências fazem lembrar situações de outras obras de Hergé.
Ambientado em locais exóticos (o Brasil é o cenário exótico por excelência para os franceses), a obra de Philippe De Broca (1933-2004) prenuncia de alguma forma a onda de aventuras que haveria de rebentar muitos anos depois pelas mãos de Steven Spielberg, quando este criou a personagem de Indiana Jones e o fez viver mil peripécias, como nos bons tempos dos serials americanos, onde o herói se vai encontrando sempre em situações cada vez mais difíceis e perigosas. Aliás, honra lhe seja feita, Spielberg nunca escondeu a grande influência que este filme teve na criação do seu arqueólogo aventureiro.
O Rato Cinéfilo
IMDB
ESTE É UM FILME DE MOVIMENTO, E O MOVIMENTO É A LINGUAGEM DO CINEMA. O HOMEM DO RIO É, PORTANTO, UMA OBRA CINEMATOGRAFICAMENTE CERTA... (Diário Popular)
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