segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

As Jóias da Castafiore (versão da revista Tintin) visto pel' As Leituras do Pedro

Mal amado por muitos, o álbum As Joias da Castafiore é possivelmente o mais original e desafiador da série. Com ele, nele, Hergé assumiu sempre querer contar uma história em que nada acontece ou, mais exactamente, em que nada do que parece é realmente.

Para mais com toda a acção a ter lugar num espaço fechado, o Castelo de Moulinsart - na acepção ampla de edifício, jardins e terrenos adjacentes, o que não inviabiliza o escrito atrás.

Com o preconceito latente e evidente para com os ciganos, os sucessivos desaparecimentos das jóias da diva do belcanto, as confusões provocadas pela surdez do professor Girassol e as constantes quedas devido ao degrau partido, este é um relato em que todos parecem correr de um lado para outro, como baratas tontas, sem objectivo definido, mas em que o leitor é mantido em suspense página após página, supondo ou adivinhando o que nunca se concretiza, apontando o dedo a (vários) inocentes e pensando antecipar o que nunca chega a acontecer, pois os olhos de quem lê vêem mais do que o autor alguma vez mostra, num exercício de estilo sublime, que deve ser lido de espírito aberto, pela desvio inegável aos outros álbuns da série, sem que de alguma forma, alguma vez, renegue o espírito, a forma ou o modo como sempre encaramos Tintin.

Introduzindo - há mais de 60 anos! - paparazzi e televisão a cores - e hoje, para o bem e para o mal, hoje não vivemos sem eles - Hergé comprovou também ser o autor visionário que sempre foi, para além de um mestre incomparável na eficácia narrativa do seu desenho.

Não me quero repetir, por isso remeto ao desenvolvimento do que atrás fica escrito para este outro texto sobre As Jóias da Castafiore, obra-prima da banda desenhada e de um autor genial.

A Edição

Este recurso a versões de revista, álbuns duplos, fac-simils ou livros com novas cores - com as devidas diferenças entre estas opções editoriais, que tanto revelam a forma de trabalhar do autor como traem aquilo que ele fez (ou deixou de fazer…) - não são mais do que a tentativa desesperada que a Moulinsart e, por arrastamento, a Casterman estão a fazer para tentarem colocar no mercado, novidades de um herói que, em boa verdade, já não as tem há quase 50 anos.

No caso presente, a edição abre com uma introdução que contextualiza o álbum na linha cronológica da série e na vida autoral e pessoal de Hergé, apontando algumas das parcas diferenças que a versão mais popularizada tem em relação à que agora é apresentada. Curiosidades sim, mas nada de mais, na verdade - e noutras aventuras a versão revista Tintin fará muito mais sentido - pelo que esta edição será mais para os indefectíveis de Tintin e Hergé, embora possa soar a ‘novidade’ para o leitor comum.

Fica como principal nota distintiva, para lá de uma capa diferente, o aumento significativo da mancha impressa em relação à versão em álbum até agora disponível, o que permite uma maior fruição da obra.

in As Leituras do Pedro

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