O que é que se pode dizer sobre Tintin que ainda não esteja dito, no dia em que celebra o seu 77º aniversário? Muito pouco, na verdade, uma vez que a obra já está dissecada de todas as formas possíveis e imaginárias. É verdade que a vontade de Hergé em levar consigo para a eternidade a personagem do jovem repórter contribuiu, e de que maneira, para isso. Na verdade, à falta de material novo, rebusca-se o antigo, procuram-se novos enquadramentos, compilam-se curiosidades. É assim que surgem livros a mostrar os automóveis de Tintin” (“Tintin-Hergé-Les Autos”) e as cidades visitadas (“Tintin et la Ville”). Além disso, surgiram livros com os esboços, além de edições especiais das diversas histórias (“Les Archives d’Hergé), sem esquecer as aventuras propriamente ditas.
Tintin sempre teve um enorme sucesso entre o público português, especialmente até à geração que hoje está na casa dos trinta. Assim, não é de estranhar o lançamento da obra “Tintin – O Sonho e a Realidade”; de Michael Farr. A edição original já a possuíamos há quase quatro anos, saída do prelo das Editions Moulinsart. Agora, a Verbo lança a versão portuguesa, facto com que os amantes de banda desenhada e, arrisco, o público em geral só se pode congratular.
Estruturalmente, a obra está dividida em 21 capítulos, tantas quantas as aventuras do nosso heróis, uma vez que os álbuns duplos, como os nossos favoritos “O Segredo do Licorne/O Tesouro de Rackham, o Terrível”, são analisados conjuntamente.
A análise começa, obviamente, com “As Aventuras de Tintin no País dos Sovietes” e vai até ao inacabado “Tintin e a Alph-Art”. O trabalho de Farr é, a todos os níveis, brilhante. Para cada episódio, o autor enquadra o contexto da aventura, mostra as influências de Hergé; as fotos de pessoas, lugares e edifícios que serviram de base a certas pranchas; as alterações que o desenhador introduziu entre as versões a preto e branco e a cor de cada álbum, entre muitos outros pormenores. Há ainda espaço para pequenas in-jokes, como o seu auto-retrato no meio de certas cenas (outro génio, Hitchcock, fazia o mesmo, nos seus filmes...) ou o dos seus colegas desenhadores, como o ainda mais genial E.P. Jacobs.
Mas, se tudo isto é verdade, também o é o facto de “As Aventuras de Tintin” terem alcançado o estatuto de clássico. Como tal, multiplicam-se os estudos sobre a mais célebre criação de Hergé, Georges Remi de seu verdadeiro nome. Boa parte delas são exaltações e consagrações do autor, como a imprescindível biografia “Hergé-Fils de Tintin”, de Benoit Peeters (Flammarion) ou o enciclopédico “Le Monde d’Hergé”, do mesmo autor– já na sua segunda versão. E ainda temos “Le monde inconnu d'Hergé”, de Bernard Portevin (Dervy), “Le Secret d'Hergé” de Serge Tisseron, de que conhecemos, igualmente, o quase lendário “Tintin chez le psychanalyste” (Aubier), isto para além de muitas mais obras consagradas ao universo do jovem repórter do Petite Vingtiéme. Outras, embora mostrando reconhecimento e admiração, sempre vão deixando algumas críticas, como acontece com o incontornável “Tintin chez Jules Verne”, da dupla J.P. Tomasi e M. Deligne, onde são feitas acusações de que a linha entre inspiração e plágio poderá ter sido ultrapassada por Hergé, em relação ao visionário romancista.
http://ovilacondense.blogspot.com/2006/01/tintin-o-sonho-e-realidade-de-michael.html
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