IMAGINE um restaurante onde se paga muito, a comida é sofrível e os clientes saem de lá contentes. Márcia Nasser, uma carioca de 50 anos - em férias por Lisboa - define desta forma o Bianca Fiore: «A comida podia ser bem mais cuidada, mas os empregados a cantarem ópera são muito gostosos! É uma ideia muito boa». Tão boa que enche diariamente uma sala de jantar com cerca de 70 lugares, com a vantagem (para os donos) de o valor de cada refeição ser suficiente para pagar o trabalho diário de um cantor, a verdadeira atracção da casa.
Teresa Gonçalves, 36 anos, é uma das artistas contratadas; só actua duas vezes por semana (tal como os restantes 26 colegas), e recebe 6500$00 por noite: «Para cantar e fingir que sirvo à mesa. Quando me desafiaram achei a ideia engraçada mas, agora, nem tanto. Já começo a ligar ao (pouco) que ganho». Opinião diferente é a da veterana Elisete Teixeira (50 anos): «Esta arte morre connosco e, por isso, nós nunca dizemos que não», aos desafios. Elisete reparte o tempo entre várias profissões que privilegiam o uso da voz; é cantora, terapeuta da fala e, enquanto actriz, representa a peça «Antes e Depois» - em regime de café-concerto - no Teatro da Trindade (aos sábados, durante o mês de Abril).
A sua longa carreira profissional fá-la lamentar as falhas deste projecto: «Isto é novo em Portugal; as pessoas que vêm aqui gastam o seu dinheiro para terem uma coisa diferente. Temos de explorar isto e ver qual é a melhor forma de tirar partido dos cantores, que são bastante bons. Uma falha evidente é os organizadores nunca anunciarem quem vai cantar, nem quais são os trechos interpretados». As condições físicas de trabalho também são bastante adversas: «Algumas pessoas que vêm cá não gostam de ópera nem respeitam os cantores. Falam muito durante as actuações e fumam charuto para cima de nós», diz Teresa Gonçalves.
Elisete e José Manuel Coelho (42 anos) são velhos companheiros do coro do Teatro Nacional de São Carlos. José Manuel não canta no restaurante; é o mentor do projecto e director artístico da «Opera Buffa» - companhia a que pertencem os cantores. Enquanto empresa, a «Opera Buffa» surge para dar resposta ao vazio de mercado criado pelo desafio de abrir um restaurante em que os cantores fazem de empregados: «Mas ainda falta imenso trabalho; isto não é de perto nem de longe o meu projecto, que é mais o de 'singing waiters'. Eu quero uma coisa em que os cantores se misturem mais com as funções do empregado; podem servir o vinho, por exemplo, para deixarem o cliente mais surpreendido», diz José Manuel. De momento, o director artístico da «Opera Buffa» esforça-se por limar todas as arestas nestas «performances» no Bianca Fiore, e projectar o trabalho da companhia para lá deste espaço.
O Bianca Fiore é um negócio de amigos e um invento de família. A ideia de abrir uma casa com estas características - em Portugal - pertence a António Simões de Almeida (antigo proprietário do Hotel da Lapa), um dos donos do Bianca Fiore; António delegou a gestão do novo negócio no seu filho Vasco, 25 anos: «O último sítio onde estagiei - na sequência do meu curso de hotelaria - foi no Hotel Four Seasons, em Chicago. Nesse hotel existia um restaurante, o Primavera, com pessoas a cantar ópera. O meu pai achou a ideia interessante» e, alguns meses mais tarde, surgiu a oportunidade de abrir o Bianca Fiore. Isto aconteceu em Dezembro último e - passe a ementa simplista de «pastas» e bifes, e a (grande) rotatividade dos chefes de cozinha - o negócio corre bem.
Alguns cantores já foram contactados por outros profissionais de restauração interessados em abrir outras casas com estas características em Lisboa. Inês Madeira, 25 anos, é estudante de canto: «Isto já estava a funcionar quando um colega me falou do projecto; vim cá para uma audição informal e fiquei. Tenho uma convivência diferente com o público, acabo por me divertir, e tenho trabalho». O (pouco) dinheiro que ganha dá para os alfinetes: «São uns trocos que dão jeito», diz o alentejano Paulo Carrilho, 23 anos: «Desde que vim de Évora para Lisboa comecei a cantar em coros; faço reforço no São Carlos e foi aí que surgiu o contacto. Estou aqui porque gosto de cantar», embora, «teoricamente» seja estudante de Física na Faculdade de Ciências.
João Oliveira, 22 anos, é o benjamim do grupo que actua à segunda-feira; queixa-se do fumo e do barulho, mas está bastante divertido com a experiência Bianca Fiore; o restaurante «herdou» o nome de uma célebre personagem do Tintim, a cantora de ópera Bianca Castra Fiore. Na opinião do crítico de BD João Paulo Boléo, Castra Fiore «é uma personagem caricaturada», que surgiu nos meados da década de 30. No princípio dos anos 60, Hergé dedica-lhe o álbum As Jóias da Castra Fiore, um «livro fundamental deste autor», diz Boléo. Já agora, convém recordar que a expressão Opera Buffa surge na Itália do século XVIII, como ramificação da «Commedia dell'arte» da Escola Napolitana.
MANUELA GOUCHA SOARES, Vidas, Expresso, 15/04/2000
(Bianca Fiore; encerra aos domingos. Tel: 213901022)
O restaurante Bianca Fiore é um espaço recente que se encontra, desde de Novembro de 2000, ao cuidado do Sr. António Simões de Almeida e do Eng.º Paulo Tomé.
O antigo Xico's Bar é, hoje, um espaço cuidadosamente criado para que o visitante possa apreciar o seu delicioso jantar de uma forma original num ambiente agradável e bastante romântico.
Bianca Fiore.... o sabor de fantásticas iguarias inspiradas na cozinha italiana com um acompanhamento original... a Ópera.
Rua Correia Garção, Nº 3
1200 - 640 Lisboa
O restaurante Bianca Fiore tem uma equipa de profissionais, desde os empregados aos músicos, constítuida por: cinco pessoas na sala, cinco na cozinha, um Copeiro e o Gerente. O Bianca Fiore conta, também, com vinte e sete Cantores e cinco Pianistas. São eles os responsáveis por esta forma original de música ambiente.
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Pizzeria Casta Fiore
Avenida Marginal (EN 6), 2668
2775-536 Parede
Restaurante a funcionar desde 1983, com uma localização privilegiada, bem na marginal. Apresenta uma decoração colorida e um ambiente familiar, servindo boas pizzas, pastas e entradas. Destaque para o seu aprazível terraço.
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