1961-16 de JANEIRO
Hoje chegou à livraria do senhor Silvino o último álbum do Tintin, que tinha encomendado há umas semanas. Estou a fazer a colecção das aventuras originais do Tintin. Tenho os álbuns todos em francês, nas edições da Casterman. Com este, agora chegado, são já 19. Só falta a primeira das histórias desenhadas por Hergé, passada na Rússia, que pode talvez um dia ser editada também em álbum. A história "Tintin au Tibet", que agora adquiri, é gira sobretudo porque ele reencontrou um amigo de há muito, o chinês Tchang, que conheceu no "Lótus Azul".
Pode alguém achar estranho que um tipo como eu, com idade já para ter juízo, se ocupe ainda com coisas de gaiatos. E ainda por cima sou professor e, como quase toda a gente adulta e sábia diz, as histórias aos quadradinhos desviam os alunos das coisas sérias, dos estudos e da leitura como deve ser. Pois, talvez seja uma fraqueza minha, porque ninguém é perfeito e eu ainda menos. Mas há uma coisa que devo explicar: quando era gaiato, descobri o Tintin no sótão da casa do engenheiro Maldonado, ali no Rossio nos altos do café Luso. A minha mãe era muito amiga da mulher dele, a dona Judite, e íamos lá muito a casa e também a uma bela quinta deles na Fontedeira que ia por ali acima até à estrada da serra. Até andava lá de burro e o meu irmão também.
Aquela casa do Rossio era quase mágica, por causa do quintal e sobretudo por um túnel que partia de um falso armário na cozinha e depois descia até uma ruela que dava para a Estrada Nova. Mas o melhor da casa era o sótão onde conheci o Tintin e o Milou, que então se chamavam Tim-Tim e Rom-Rom, nas páginas coloridas de um antigo jornal chamado "O Papagaio", que durou desde 1935 até 1949 e depois ainda se manteve, meio morto, como envergonhada secção da revista "Flama".
Foi ali que nasceu esta minha amizade com o Tintin, que acompanhei nas suas idas à América, ao Oriente, a Angola, à China, aos desertos e aos mares sem fim.
A verdade é que nunca mais me esqueci do Tintin e ainda hoje, já crescido e ainda por cima professor, mantenho essa amizade. Se não me entenderem, que hei-de fazer?
Sabem que mais? Não me apetece hoje escrever aqui seja o que for. Bastou-me o Tintin, bom e velho amigo. Colo aqui a capa solta dum Papagaio que sobrou daqueles tempos…
António Martinó
https://largodoscorreios.wordpress.com/2016/01/16/mil-novecentos-e-sessenta-e-um-dia-016/
ver mais posts do Prof. António Martinó no seu blog ou na etiqueta largodoscorreios

Sem comentários:
Enviar um comentário